Para muitos não especialistas, a linguística aplicada não passa de uma aplicação das teorias linguísticas – o que, de fato, não corresponde à atual realidade. Na verdade, esse campo de estudos é tão vasto que, por conta disso, é difícil definir precisamente seus objetos, conceitos e métodos.
Por Edmar Cialdine
O QUE NÃO É A LINGUÍSTICA APLICADA…
Não é a melhor opção começar uma explicação dizendo o que algo não é, mas correremos o risco, já que a primeira coisa que vários linguistas da área dizem é: a LA (linguística aplicada) não é a aplicação das teorias linguísticas. Na verdade, não há um consenso nesse sentido, apenas a maioria dos estudiosos defende que, apesar da LA ter surgido como uma tentativa de aplicação das teorias da Linguística no ensino de línguas (além de outras áreas), ela, hoje, se tornou muito maior que isso e, tal qual a Linguística (teórica), passou a produzir sua própria teoria.
Acredito que exista uma palavra- chave para se compreender a LA: problema. Sendo mais específico, a princípio, a LA se volta para problemas relacionados com a linguagem que possuem um reflexo direto ou indireto na Sociedade – ou seja, ela vai para além do estudo restrito e específico da linguagem. Ao tratar de todo e qualquer problema, ela se torna uma área de estudos inter, multi, pluri e transdisciplinar. A LA está em uma posição que ela dialoga com várias áreas diferentes dependendo do tipo de problema que ela se propõe a estudar. Nesse sentido, ela não só faz uso de teorias e metodologias outras – desenvolvendo as suas próprias – como, também contribui para que outros campos de estudos envolvidos com o problema em questão se desenvolvam. É isso que a torna inter, multi, pluri e transdisciplinar.
Com a divisão dos estudos da linguagem em estudos de língua e estudos de literatura, os profissionais que se dedicavam exclusivamente à língua se voltaram para os estudos linguísticos. A Linguística era considerada muito mais objetiva que a Literatura, o que ia ao encontro das necessidades do ensino tecnicista que vigorava e o processo de globalização que se iniciava.
Após o fim da Segunda Guerra Mundial, o ensino de línguas se tornou uma importante ferramenta de divulgação de ideias, modo de vida e cultura de cada país envolvido com a Guerra Fria (em especial os EUA). Assim, a partir da década de 50, o interesse pela formação de professores se acentuou, surgindo os “Teacher’s trainers”, profissionais responsáveis por essa formação continuada dos professores de inglês, e, com eles, as teorias linguísticas eram aplicadas ao ensino de línguas.
A necessidade de divulgar a língua inglesa rapidamente fez com que a ênfase fosse dada ao processo de ensino e não ao processo de aprendizagem, isto é, o foco era o professor, não o aluno. Como consequência disso, várias metodologias de ensino (ver box) foram surgindo. Na verdade, a falta de resultados positivos de alguns métodos fez com que surgissem cada vez mais métodos e, com isso, a Linguística Aplicada foi se desenvolvendo para além da aplicação das teorias linguísticas, ela começou a produzir suas próprias teorias sobre o ensino de línguas. De fato, temos hoje uma área tão desenvolvida (e que continua crescendo) que já não se restringe apenas ao ensino de línguas.
EXEMPLO PRÁTICO
É claro que, por sua própria história, a educação linguística é um dos principais focos da LA. Infelizmente, nesse sentido, o ensino de língua materna, no nosso caso a língua portuguesa, bebeu pouco dessa fonte. Foi o ensino de línguas estrangeiras e segunda língua que recebeu as principais contribuições – o lado bom disso é que temos um vasto campo de pesquisa em aberto para quem trabalha com ensino de língua materna.
Na verdade, podemos dizer que a educação linguística de modo geral tem recebido contribuições indiretas. Um primeiro exemplo relaciona a LA e a Saúde, isto é, questões ligadas a distúrbios de linguagem (em especial aqueles distúrbios que influenciam na aprendizagem). Temos, assim, problemas como a Dislexia, Afasia, etc. Alguns ocorrem por acidentes no cérebro, mas há aqueles distúrbios congênitos. Nesses casos, a LA procura contribuir com áreas ligadas à Terapêutica na compreensão e soluções desses problemas.
Um segundo exemplo é o planejamento linguístico, isto é, as intervenções políticas que causam reflexo na língua. Para explicar melhor, basta refletirmos: o que define uma língua como idioma oficial? No Brasil, existem várias outras línguas além do português, mas apenas a LIBRAS conquistou status de língua oficial ao lado da língua portuguesa; na fundação dos EUA, no momento de definir o idioma da nova nação, por pouco a língua “oficial” não foi o alemão – aliás, “oficial” (entre aspas) porque a constituição americana não intitula nenhuma língua como oficial, ainda que o inglês tenha tal status extraoficialmente. Inclusive, em diversas cidades dos Estados Unidos o espnhol é consagrado como segunda língua oficial, pela forte habitação de povos hispânicos. Tudo isso sem mencionar os projetos de leis que surgem contra os estrangeirismos. Desse modo, um planejamento linguístico se mostra de suma importância para um país e a(s) língua(s) existente(s) nele e, para isso, a LA se dedica a analisar as formas e consequências de tais decisões políticas.
Um último exemplo que podemos citar relaciona a LA e as Ciências da Computação como a Informática e a Inteligência Artificial: a Linguística Computacional. Esse ramo da LA une os processos computacionais e a linguagem humana. Usos desse campo não faltam no nosso dia a dia: programas de tradução, de revisão gramatical, de reconhecimento vocal etc.
MÉTODOS DE ENSINO DE LÍNGUAS